Suprematismo e Construtivismo: a busca do nada x a funcionalidade da arte [5]
Esse é o quinto post-guia de leitura do livro do Will Gompertz – “Isso é arte”. Nele vamos falar de SUPREMATISMO e CONSTRUTIVISMO.
A ideia é colocar as obras citadas a cada capítulo e também dar pistas para ampliar um pouco as discussões sobre cada artista ou movimento.
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Índice
Suprematismo e Construtivismo: o cenário
Nesse capítulo entramos no limite da abstração?
A arte poder não representar NADA?
Parece conversa de louco, mas vamos entrar em matéria e verá que de louco não tem nada!
Na antiga Rússia se deram as condições para que a arte rompesse a tradição artística do referente.
Para isso, a arte se centrará nas propriedades físicas dos materiais que a conformam. Como assim? Nos materiais em si, do que está feita, dessa maneira o artista procura evitar que o espectador crie narrativas ao estar diante da obra.
Esse brusco rompimento se dá numa sociedade que também rompe com sua tradição e passado, levada por diferentes fatos e circunstâncias:
- uma derrota humilhante na Guerra contra o Japão (1904/1905);
- o governo do Czar Nicolás II era cada vez mais autocrático;
- a classe obreira vivia em péssimas condições, o que levou a marcha de protesta de 22 de janeiro de 1905, na qual o czar enfrentou os manifestantes com a Guarda Imperial Russa, o que levou a morte de mais de 100 trabalhadores. Esse episódio ficou conhecido como Domingo Sangrento.
- a marcha e a greve geral posterior a mesma, fomentam a criação de um conselho de trabalhadores chamado “Soviet”, que rapidamente se multiplicou pelo país, somando 150 unidades.
- por outro lado, estavam os bolcheviques, integrantes do Partido Operário Social-Democrata Russo, liderado por Lenin.
Parecia inevitável o confrontamento, mas a Primeira Guerra Mundial deu um fôlego ao czar e ao poder instituído.
Mas em 1917 a revolução tomou o poder, derrocando ao czar. Os bolcheviques estavam a frente e pretendiam construir um governo totalmente diferente do já visto.
Esse espírito chega aos artistas que compartilhavam essa visão de criar uma arte tão avançada e democrática quanto seu novo sistema de governo e que denominariam de ARTE NÃO OBJETIVA.
A artista Natalia Goncharova em 1912 afirmou: “A arte da Rússia contemporânea alcançou tais alturas que, neste momento, ela desempenha um importante papel na arte mundial. As ideias ocidentais contemporâneas não podem ter mais nenhuma utilidade para nós.”
O mecenas necessário: Serguéi Ivánovich Shchunkiv
Pode parecer a simples vista que os artistas russos queriam partir do zero, mas o que Goncharova afirmou é que eles conheciam as vanguardas ocidentais e já estavam preparados para criar algo próprio.
Grande parte dessa primeira geração havia viajado para Paris ou Munique, para ver as obras e entrar em contato com artistas como Picasso. Os dois grandes nomes da arte russa, Malevich e Tatllin apreciavam o trabalho de Picasso e Tatllin havia visitado o malaguenho em Paris.
Os artistas que não puderam aceder “in locu” as vanguardas, tinham à sua disposição a coleção de arte do rico empresário russo, Serguéi Ivánovich Shchukin (1854 – 1936), que abriu as portas de suas casa a essa primeira geração.
O governo revolucionário se apropriou de sua coleção de arte moderna e ele fugiu do país.
Para quem quiser saber mais sobre Serguéi e sua coleção de arte, recomendo o livro de Natalya Semenova.
Malévich
Kazimir Malévich (1878 – 1935) inicia sua andadura na arte moderna com obras conhecidas como cubo-futuristas. Ou seja, obras que eram uma espécie de remix do cubismo e do futurismo.
“Vaca e Violino” (1913) é uma das obras destacadas desse período do artista. O desenho preparatório pertence ao MOMA e a tela ao State Russian Museum (St. Petersburgo).
Para Gompertz essa obra se adianta ao dadaísmo e ao surrealismo. Ademais aponta seus reflexos décadas depois, nas ilustrações de Terry Gilliam para o programa de TV da BBC – “Monty Python´s Flying Circus”.
e assim nasce o suprematismo…
Em 1913, Malévich recebeu um convite para desenhar os cenários e figurinos da primeira ópera de estilo futurista “Vitória ao sol”. Em um desses cenários aparecia em um pano de fundo branco, um quadrado preto pintado pelo próprio artista.
Ele que já estava imbuído em criar o NADA, em se afastar da representatividade, ao olhar esse quadrado se deu conta que havia dado com o que estava buscando.
Com esse quadrado negro sobre fundo branco nascia uma nova forma de abstração pura, uma pintura totalmente não descritiva, que ele chamou de suprematismo.
Influências do suprematismo
O que pode parecer tão bobo levou à uma outra revolução no desenho industrial e gráfico, te diz algo o minimalismo? Gompertz, ainda aponta que esse caminho criado por Malévitch se reflete:
- nos looks de Tom Ford;
- nas piscinas de borda infinita;
- nos produtos Bang & Olufsen;
- nas capas dos discos da gravadora independente de Manchester – Factory Records (1978 – 1992);
- no desenho de Brasilia de Niemeyer;
- no logotipo do metrô de Londres.
A exposição 0,10 e o mundo vê o “Quadrado Negro” | Suprematismo
A tela “Quadrado negro” foi exposta pela primeira vez ao público na mítica exposição 0,10 em 1915 na cidade de St. Petersburgo. A ideia do 0,10 foi de Malevich, porque seriam 10 artistas que segundo ele haviam chegado ao zero, porque já não representavam nada reconhecível.
Ao final foram 14 artistas os que expuseram suas obras:
- Kazimir Malevich
- Vladimir Tatlin
- Ivan Puni
- Liubov Popova
- Ivan Kliun
- Ksenia Boguslavskaya
- Olga Rozanova
- Nadezhda Udaltsova
- Nathan Altman
- Vasily Kamensky
- Vera Pestel
- Maria Ivanovna Vasilieva
- Anna Mikhailovna Kirillova
- Mikhail Menkov
Suprematismo e Construtivismo OU Malévitch x Tatlin
Malevich e Tatlin eram rivais declarados e pela colocação das obras na exposição 0,10, chegaram as vias de fato. Malevich colocou seu quadrado negro numa esquina, local reservado nos lares ortodoxos às imagens religiosas. Tatlin jurou de pé junto que ele tinha roubado sua ideia!
Tatlin expôs “Contrarrelevos de canto” (1912). Ele começou a produzir esse tipo de obras depois de visitar Picasso e ver sua “Guitarra” (capítulo do Cubismo).
Só que Picasso representava um objeto com sua obra e ele ao contrário não queria representar nada. E ainda empregava materiais relacionados com a indústria, como nessa obra, onde usa ferro, vidro e aço. E praticamente sem modificá-los.
Sua obra terá ressonância nos grandes nomes da arquitetura contemporânea como, Frank Gehry e Norman Foster.
O Construtivismo
A obra de Tatlin formará parte do CONSTRUTIVISMO e o artista será seu primeiro teórico. Esse movimento estará diretamente ligado à estrutura do poder e desenvolverá a identidade visual do comunismo.
As mulheres estarão presentes no movimento e exercerão papeis de liderança.
Nomes que se destacam, ademais de Tatlin: Liubov Popova (1889 – 1924), Alexander Rodchenko (1891 – 1956), Alexandra Ekster (1882 – 1949), Varvara Stepanova (1894 – 1958), El Lissitzky (1890 – 1941).
Para o comunismo, a arte devia ser útil ao povo, portanto além de criar pinturas, esculturas, elementos gráficos, também desenharam, roupas, móveis, papel de parede, produtos para casa e até “arquiteturas”, como o projeto de Tatlin que pretendia competir com a Torre Eiffel – “Monumento à Terceira Internacional”, já que teria 400 metros de altura!
A Onward fez uma simulação de como seria a obra de Tatlin se houvesse sido construída, clique aqui para ver o artigo original.
A exposição 5×5=25
O movimento construtivista vai organizar uma grande exposição realizada entre setembro e outubro de 1921 em Moscou.
A mostra se chamou “5 x 5 = 25”, porque eram cinco artistas construtivistas apresentando 5 obras:
1. Aleksandra Ekste
2. Liubov Popova
3. Alexander Rodchenko
4. Varvara Stepanova
5. Alexander Vesnin
Uma das obras de Rodchenko foi “Cor vermelha pura, Cor azul pura e Cor amarela pura” (1921), que influenciou de forma direta o Expressionismo abstrato praticado por Mark Rothko.
Mas é certo que Rothko vai dar uma volta total à ideia de Rodchenko, já que para ele a arte tinha a função de proporcionar uma experiência mística.
Outras obras citadas do construtivismo por Gompertz
- Vestidos de Liubov Popova.
- Capa do livro de Trotsky “Questões do modo de vida” (1923) realizada por Alexander Rodchenko. Para descarregar o livro em espanhol, clique aqui.
- Cartaz “Derrote os Brancos com a cunha vermelha” (1919) realizado por El Lissitzky. Para Gompertz a capa do disco “Man-Machine” do grupo pioneiro da música eletrônica – Kraftwerk – deve muito a produção gráfica de El Lissitzky.
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