Cubismo – Isso é arte [3]
Esse é o terceiro post-guia de leitura do livro do Will Gompertz – “Isso é arte”. Nele vamos falar de CUBISMO e FUTURISMO.
A ideia é colocar as obras citadas a cada capítulo e também dar pistas para ampliar um pouco as discussões sobre cada artista, movimento ou escola.
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Gostaria que esse post fosse colaborativo. Sei que o pessoal já não comenta muito nos sites, mas desejar é grátis, né ? Assim se você tiver links para materiais ou livros, por favor, coloque sua contribuição nos comentários!
Para acessar o guia:
– dos Capítulos 1 a 5, clique aqui.
– do Capítulo 6 (Fauvismo e Primitivismo), clique aqui.
Índice
Cubismo … e tudo começa com “Les Demoisseles de Avignon”
Para muitos, essa pintura de Picasso marca o início da ARTE MODERNA. Pintada entre os meses de junho e julho de 1907 é uma tela de grandes dimensões, revelando que para o artista era uma obra importante.
Era tão rompedora, que sequer foi bem recebida por seus amigos da vanguarda.
André Derain ao vê-la,profetizou o suicídio de Picasso.
Matisse, que ele seria o responsável pela morte da pintura.
Braque que era “como se ele bebesse petróleo enquanto engolia uma tocha”.
Antecedentes do Cubismo
Picasso chega em Paris numa época conhecida como Belle Époque, que começa com o final da guerra franco-prussiana e perdura até a 1a- Guerra Mundial.
Era um mundo de avanços tecnológicos, entre eles a luz elétrica, os automóveis e o telefone. Sigmund Freud falava sobre a interpretação dos sonhos. Ernest Rutherford demonstrava que a energia estava em constante movimento, portanto não apresentava uma estrutura estável. E como veremos com Einstein, o espaço e o tempo não eram dimensões rígidas e constantes como pensava Newton.
A Teoria Especial da Relatividade (1905) de Einstein trata da simultaneidade, a mesma que veremos nas telas cubistas. Mas tanto Einstein quanto Picasso negaram sua influência no cubismo.
Picasso afirmou que a fotografia foi uma das influências mais importantes para ele,
“foi o catalizador de uma análise desconstrutora, testemunha e propulsora de uma reconsideração tanto da pintura, como da imagem e de seus suportes”.
O cinema e a possibilidade que ele criava de colocar diferentes pontos de vista na tela, pode ter sido outra influência. Até a 1a. Guerra Mundial, o cinema era um entretenimento basicamente francês.
Picasso versus Matisse
Além da influência artística de Cézanne, depois de ver na casa dos Stein, a tela de Matisse – “Alegria de Viver”, Picasso também queria criar sua obra rompedora.
Só que a tela de Matisse deleitava, acalmava, enquanto “Les Demoiselles de Avignon” produzia exatamente a sensação contrária.
Picasso e El Greco
Gompertz também explora a influência de El Greco na obra de Picasso. Aliás, nos últimos anos, os historiadores vem reivindicando a influência de El Greco em vários artistas da vanguarda.
O autor relaciona “Les Demoiselles de Avignon”(1907) com a tela “A abertura do quinto selo” de El Greco, realizada entre 1608 e 1614.
Cubismo – Outro ponto de vista
Se o cubismo começa com “Les Demoiselles de Avignon”, é importante lembrar que essa tela vai ficar enrolada no estúdio de Picasso por anos. Portanto, foi o detonante, mas o movimento não foi coisa só de um homem. E sim um projeto artístico de dois: Picasso e Braque.
Eles trabalharam sem parar e tão coordenados, que sem a assinatura dos quadros, era praticamente impossível dizer quem pintou o quê!
No seguinte vídeo, eu explico como seria a captação da imagem dos cubistas.
o mecenas necessário – Kahnweiler
Para que pudessem levar sua pesquisa adiante, quebrando todas as barreiras acadêmicas da pintura, que ainda estavam de pé, eles contaram com a ajuda financeira do marchand: Daniel-Henry Kahnweiler (1884 – 1979).
Kahnweiler foi o primeiro a assinalar “Les Demoiselles de Avignon” como a origem do cubismo.
Ele viu a tela na sua primeira visita a Picasso, no Bateau Lavoir (Montmartre). Inclusive quis comprá-la, mas depois das críticas de seus companheiros, Picasso preferiu deixá-la no estúdio.
Nessa visita, o marchand também viu alguns dos primeiros quadros do projeto do artista com Braque e ofereceu dinheiro a Picasso para que continuasse trabalhando nessa nova forma de fazer arte. Depois estendeu a oferta também para Braque.
Tal qual havia acontecido com Durand-Ruel e os impressionistas, Kahnweiler foi o mecenas necessário para que o cubismo mudasse todos os paradigmas da arte ocidental.
Para saber mais sobre Kahnweiler:
Características do cubismo
– reduzida escala cromática (paleta sóbria);
– uso de cores com menos impacto volumétrico;
– deixam de lado a perspectiva renascentista;
– ao invés trabalharam com muitos planos e para passar de um plano a outro (transições de plano), usaram constrastes cromáticos e uma linha reta, a modo de contorno;
– a tela forma parte da obra, não apenas como suporte, mas como elemento constitutivo;
– o artista não utiliza um único ponto de vista, portanto vai orbitar diante do motivo (informação de diferentes pontos de vista e de distintos ângulos);
– esses múltiplos pontos de vista captam as diferentes realidades do motivo;
– figura e fundo terão a mesma importância;
– o espaço se distorce como as figuras, já não é um elemento estável;
– pela primeira vez na história da arte, o quadro não funciona como uma janela, tampouco é um instrumento de ilusão, mas um objeto por si mesmo. Ao que Picasso chamou de “pintura pura”;
– não assinaram na parte da frente de muitos quadros, visando despersonalizar a linguagem pictórica através do anonimato.
Para saber mais sobre o cubismo:
O nome – cubismo
Como outros tantos nomes que já vimos, foi novamente dado por um crítico de arte e de forma pejorativa. Outra vez, aparece Louis Vauxcelles, o mesmo que antes havia chamado Matisse & Cia. de “fauves”.
Braque apresentou alguns de seus quadros em 1908 no Salão de Outono, em Paris. Entre as telas se encontrava “Casas en L´Estaque” e outros 5 quadros e todos foram rejeitados. Mas dentre os membros do jurado haviam 2 artistas que repescaram dois deles. Braque ficou bravo prá dedéu e retirou todos da mostra.
Kahnweiler expôs em sua galeria essas obras e foi quando Louis Vauxcelles referindo-se às obras e aos artistas se manifestou:
“são geômetras ignorantes, que reduzem a paisagem e o corpo humano a insípidos cubos”.
O próprio Vauxcelles utilizou o termo “cubismo” em um artigo que realizou sobre o Salão dos Independentes de 1909 para falar de outros dois quadros de Braque.
O nome cubismo não encaixa bem, tendo em vista que eles nunca quiseram recriar o tridimensional, mas sim assumir a bidimensionalidade da tela.
* geômetras: Aquele que é versado em geometria ou escreve sobre esta ciência.
“geômetras”, in Dicionário Priberam da Língua Portuguesa [em linha], 2008-2020, https://dicionario.priberam.org/ge%C3%B4metras [consultado em 26-05-2020].
Cubismo analítico: 1908 – 1911
A fase inicial do cubismo se conhece como analítica, “assim chamada pela sua análise obsessiva do tema pintado e do espaço que ocupa” (Gompertz, 2012: p. 152).
Nunca os dois artistas quiseram chegar à abstração. Tanto que quando se aproximavam do limite entre figuração e abstração, experimentavam com novos elementos ou novas proposições.
E é esse o caso nessa tela. Na parte de cima vemos um prego e inclusive a sua sombra. É algo bastante real e pintado de forma tradicional. Uma isca para atrair nosso olhar e conseguir nossa atenção. E como alerta Gompertz:
“Braque simplesmente está usando uma técnica clássica para acentuar a radical novidade de seu método”(2012: 155).
E eu somaria: para deixar claro que o quadro trata do mundo real e que eles nunca quiseram ultrapassar o limite da figuração.
Pintar …
Não aquilo que viam, mas tudo que sabiam do motivo, portanto, seu conhecimento sobre o mesmo.“Ambos buscavam alcançar um modo de representação de como são realmente as coisas no mundo e de como essas coisas existem nesse mundo” (Gompertz, 2012: 156).
Juan Gris (1887 – 1927)
Juan Gris vai se juntar ao movimento, de uma forma casual, já que ao chegar em Paris, foi viver no Bateau Lavoir, o mesmo edifício de Picasso, em Montmartre.
A partir de 1912 começa a desenvolver seu próprio estilo, que se reconhece na tela “O homem no café”.
Integrou uma figura cubista numa quadrícula e num entorno reconhecível. Além do que usou uma paleta de cores mais vivas.
O temor à abstração
Esse temor se converteu num alarme louco e contínuo. Quando Picasso começou a eliminar certas parte de um motivo para deixar em seu lugar um vazio, o que pensou? Incluir palavras/letras. E uma das primeiras composições onde se vê essa inclusão é “Ma Jolie”.
Nesse quadro, a decomposição da imagem é tão espetacular que o espectador que apenas passa os olhos pela tela, pode julgar que é abstrata. E para que isso não ocorra e (novamente) como isca coloca as letras que dão título à pintura.
“Ma Jolie” era como Picasso chamava ao seu amor, Marcelle Humbert. Nome que havia tirado de uma canção popular da época e por isso, também pinta uma clave de sol junto às letras.
“O fato de introduzir texto foi muito ousado: a arte sempre havia operado com imagens, não com letras. Emprestar elementos de uma forma de comunicação para reforçar outra era uma iniciativa audaz e atrevida” (Gompertz, 2012: 158).
E nasce o Cubismo Sintético
Braque e Picasso estavam se aproximando perigosamente de uma superfície totalmente plana. O que poderia dificultar cada vez mais a leitura da imagem pelo espectador.
E olha o medo aí novamente de transpor de limites! Dessa vez a primeira solução de Braque foi tornar a tinta mais densa para alcançar mais volume. Para tanto, misturou à tinta, terra e gesso.
Começaram a utilizar além dos pincéis, objetos como um pente para criar diferentes texturas na tela.
E por fim, Picasso abandonou a bidimensionalidade da tela que se converte quase em objeto ao colar na superfície pedaços de jornais e até um plástico que imitava a palha e se fosse pouco, a moldura é uma corda trançada!
A incorporação da vida cotidiana na tela, isso era ir muito além de representar a modernidade! Era colocá-la diretamente no plano pictórico.
“Picasso pegou um produto feito em série e o converteu em algo único e valioso” (Gompertz, 2012: 160).
Para ampliar a imagem: https://www.artsy.net/artwork/pablo-picasso-still-life-with-chair-caning
“Prato de fruta e copo” (1912), Braque
O mais louco dessa pintura é que não há pintura, apenas desenho a carvão e papel de parede.
Guitarra (1912) de Picasso
Para saber mais e escutar audios sobre uma exposição em que o MOMA parte dessa guitarra de 1912, clique aqui.
O fim do cubismo e legado
O cubismo praticamente vai influenciar todos os movimentos subsequentes, mas a dupla artística se desfez com o início da 1a. Guerra Mundial.