Como entender arte abstrata | – Isso é arte [4]
Esse é o quarto post-guia de leitura do livro do Will Gompertz – “Isso é arte”. Nele vamos falar de ARTE ABSTRATA.
A ideia é colocar as obras citadas a cada capítulo e também dar pistas para ampliar um pouco as discussões sobre cada artista, movimento ou escola.
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Gostaria que esse post fosse colaborativo. Sei que o pessoal já não comenta muito nos sites, mas desejar é grátis, né ? Assim se você tiver links para materiais ou livros, por favor, coloque sua contribuição nos comentários!
Para acessar o guia:
– dos Capítulos 1 a 5, clique aqui.
– do Capítulo 6 (Fauvismo e Primitivismo), clique aqui.
– Capítulos 7 e 8 (Cubismo e Futurismo), clique aqui.
Índice
Como entender arte abstrata!?
Nos capítulos desse mês, entramos no fascinante mundo da abstração. O próprio autor confessa que é complicado explicar quando estamos diante de um quadro não-figurativo que seja realmente bom e que se diferencie de um simples rabisco.
Tudo é uma questão de treinar o olhar. E existe um paradoxo. A arte abstrata pode suscitar fortes emoções, mas por outro lado, diferente da arte figurativa, se desvincula de narrativas. E chegado a esse ponto, aqueles olhares menos experimentados nos elementos da linguagem visual podem rejeitá-la de plano. Porque sentem falta das histórias que é uma das únicas formas que conseguem experimentar as obras de arte.
Mas isso não é uma crítica. A maioria das pessoas nunca foram educados visualmente e por isso são reféns de um mundo onde as imagens são as rainhas!
Por isso é tão importante estudar arte, não só para ser mais feliz 😉 mas também para “ler” as entrelinhas de tudo que nos rodeia.
Sei que sai do livro, mas sentia que era um inciso necessário!
A definição de arte abstrata
Gompertz de cara nos oferece uma definição:
“Por arte abstrata se entendem todas aquelas pinturas e es culturas que não imitam ou sequer pretendem representar nenhum motivo físico real” (p. 179).
Os caminhos que levaram à abstração
Para o autor, os impressionistas semearam o caminho que chegará à Kandinsky. Como viveram em primeira pessoa a difusão da fotografia, já não tinham necessidade de se apegar ao realismo e traçaram novos desafios. Nesse caminho para o novo, foram eliminando detalhes, chegando pouco a pouco a essência das coisas.
Gompertz cita uma obra de Manet, como exemplo dessa economia de detalhes: “O bebedor de absinto”.
O Orfismo
Alberto Bernabé começa sua palestra sobre o orfismo, definindo-o como uma forma de entender a religião grega.
E é com esse nome que o poeta Guillaume Apollinaire vai batizar a pintura que um grupo de artistas desenvolvia em Paris no começo da década de 1910. Para ele o que eles produziam era uma interpretação do cubismo, mas cheia de cor e que tendia à abstração.
Alfred Barr ao criar uma espécie de mapa mental da arte moderna para o catálogo da exposição “Cubismo e Arte Abstrata” de 1936. Na imagem, o orfismo aparece relacionado com o cubismo e junto a ele a data – 1912.
Os nomes ligados a essa tendência foram: Robert e Sonia Delaunay, Fernand Léger, Francis Picabia, Frantisek Kupka e Marcel Duchamp.
Numa palestra em 1912, Apollinaire argumentou que o cubismo órfico, mais ou menos caracterizado por uma tendência à abstração, representa uma “arte pura” que consiste em “elementos não emprestados da realidade visual.
“Apollinaire argumentou com reflexos poéticos típicos, o cubismo órfico apareceu na luz – e somente na luz – da pintura de Picasso, mas foi mais claramente representado na obra de Delaunay, “com Fernand Léger, Francis Picabia e Marcel Duchamp também fazendo grandes avanços”.
“O Primeiro Disco” (1912-1913) – Robert Delaunay | Coleção privada
A primeira tela abstrata
Já não existe consenso de quem seria a primeira tela realmente abstrata: Kupka, Kandinsky, Delaunay?
“O Primeiro Passo” (1909 – 1913) – Kupka | MOMA, New York
“Amorpha, fugue en deux couleurs” (1912) – Kupka | Narodni Galerie | Praga
Para saber mais sobre Kupka, leia a entrevista a Brigitte Leal, curadora da retrospectiva do artista no Grand Palais (Paris).Historicamente, muitas vezes se atribui a Kandinsky, o que você pode entender melhor no vídeo que dediquei a ele no Top100Arte.
Acredito que atualmente o que importa é quem impactou antes a outros artistas e ao público. Porque se você pinta um quadro super inovador, mas o esconde de todos, qual é seu impacto? Nulo!
E esse é o caso de uma artista mulher que teria sido a pioneira, mas que manteve sua obra guardada a sete chaves: Hilma af Klimt.
Hilma af Klimt
Hilma (1862 – 1944) nasceu na Suécia e pintou sua primeira tela abstrata em 1906. Portanto, claramente foi a pioneira da arte abstrata. Mas como já comentei, ela não participou de nenhum movimento e/ou exposição.
Ela pintou aproximadamente 1.300 quadros abstratos entre 1906 e 1925, ano que abandona a pintura para se dedicar a teosofia.
Pouquíssimas pessoas conheciam suas obras e a maioria relacionada com a teosofia. E foi o teósofo Rudolf Steiner quem lhe recomendou que não mostrasse suas obras, alegando que o mundo não estava peparado!
Apenas no final do século 20, suas obras foram descobertas e apenas em 1988 ganhou sua primeira exposição.
Site da Fundação Hilma af Klint: https://www.hilmaafklint.se/en/
Arte abstrata e música
A maioria das tendências abstracionistas está diretamente relacionada com a música.
Da mesma forma, que a música sem letra, eles queriam realizar uma pintura sem narrativa. Apenas “harmonia e notas musicais”, claramente relacionados com os elementos da linguagem visual, como as linhas, as cores, o ritmo.
Fontes inspiradoras foram Richard Wagner e sua ideia de criar uma obra de arte total que envolvesse diferentes disciplinas artísticas, apoiado por sua vez nas teorias de Arthur Schopenhauer (1788 – 1860).
E no século XX, a música de Schoenberg (1874 – 1951), que conviveu com os artistas visuais e foi amigo de Kandinsky.
Obras citadas de Kandinsky
“Múnich-Planegg I” (1901) | Coleção privada
Murnau, rua de aldeia (1908) | Tate, Londres
Kochel (1909)
Improvisação IV (1909) | Nizhny Novgorod State Museum of Fine Arts, Rússia
Impressão III (1911) | Galerie im Lenbachhaus and Kunstbau, Munique ( A obra que pintou em dois dias, após assistir em 1911 um concerto de Schoenberg em Munique).
Primeiro quadro totalmente abstrato de Kandinsky
Composição IV (1911) | Kunstsammlung Nordrhein-Westfalen | Dusseldorf
Composição VII (1913) | The State Tretyakov Gallery, Moscou
Clique aqui e depois no retângulo vermelho para aceder a um livro de gravuras de Kandinsky.
Kandinsky e o livro “Do Espiritual na Arte”
No mesmo ano que pinta sua primeira tela totalmente abstrata, também publica o livro “Do espiritual na arte”, onde discorre suas teorias sobre a arte e a cor.
“Em termos gerais, a cor é uma força que influencia diretamente a alma. A cor é o teclado, os olhos são os martelos; a alma é o piano com suas muitas cordas. O artista é a mão que toca, pressionando uma tecla ou outra, para causar vibrações na alma.”
Der Blaue Reiter (O Cavaleiro Azul)
Kandinsky e Franz Marc conformam em Munique em 1911 um coletivo de artistas sob o nome “Der Blue Reiter” (O Cavaleiro Azul).
Rejeitavam o impressionismo, o positivismo e a sociedade do seu tempo, que desde seu ponto de visto era hipócrita, mergulhada numa falsa felicidade numa época em que se vivia na ante-sala do primeiro grande conflito mundial.
Ao grupo se somaram outros artistas, como Robert Delaunay, Arnold Schoenberg, August Macke, Gabriele Münter, Paul Klee.
Expuseram juntos naquele mesmo 1911, no mês de dezembro e depois em fevereiro de 1912, uma mostra dedicada à obra gráfica, desenhos e aquarelas, com participação de Paul Klee.
O grupo se dissolveu com a 1a. Guerra Mundial. August Macke e Franz Marc morreram na guerra.
Paul Klee
“O Cavaleiro Azul” foi determinante para Paul Klee como explica Gompertz. Ele foi motivado pelos demais artistas a encontrar sua própria identidade sem medo. E com essa auto-confiança recém adquirida viajou para Tunísia, onde a luz e as cores foram os ingredientes que faltavam para torná-lo um dos grandes da arte.
Como traz Gompertz, para Klee a arte não existia para “reproduzir o visível; o que ela faz é, antes, tornar [a vida] visível”.
* Hammamet e sua mesquita (1914) – aquarela | MET, New York
Relações entre os abstratos | Cartas
Carta de Robert Delaunay a Wassily Kandinsky, 1912
Acho útil o que você enviou neste ano. Quanto ao nosso trabalho, acho que certamente o público terá que se acostumar. O esforço que terá que fazer vem devagar, porque está afogado em hábitos. Por outro lado, o artista tem muito o que fazer no campo da construção de cores, que é tão pouco explorada e tão obscura, e dificilmente remonta mais ao início do impressionismo. Seurat procurou as leis primárias. Cézanne demoliu toda a pintura desde o início – ou seja, o claro-escuro ajustado a uma construção linear, predominante em todas as escolas conhecidas.
É essa pesquisa sobre pintura pura que é o problema no momento presente. Não conheço pintores em Paris que realmente procurem esse mundo ideal. O grupo cubista de quem você fala experimenta apenas em linha, dando à cor um lugar secundário, e não construtivo.
Ainda não tentei colocar em palavras minhas investigações nesta nova esfera, onde todos os meus esforços estão sendo direcionados há muito tempo.
Ainda estou esperando até encontrar maior flexibilidade nas leis que descobri. Estes são baseados em estudos sobre a transparência da cor, cuja semelhança com as notas musicais me levou a descobrir o “movimento da cor”. Tudo isso, que eu acredito que é desconhecido para todos, é para mim ainda na minha mente.
Estou lhe enviando uma fotografia desses empreendimentos, já ultrapassados, que surpreenderam meus conhecidos e que encontraram um julgamento adequado totalmente livre de “impressionismo” apenas em raros conhecedores.
Quando eu estava fazendo esse trabalho e lembro que você me perguntou sobre isso, eu não conhecia ninguém capaz de escrever sobre essas coisas, mas eu já havia feito algumas experiências decisivas. Até meu amigo Princet era incapaz de vê-los, e faz pouco tempo que eles começaram a ficar aparentes para ele.
Tenho confiança na interpretação que poderia ser produzida por sua sensibilidade, e parece-me que ele teve uma reação forte que levará a esse resultado. Eu acho que, no momento, ele poderá revelar o significado dessas coisas como resultado do trabalho que ele já começou há vários anos atrás, que eu trouxe à sua atenção.
(original em inglês: http://www.artchive.com/artchive/D/delaunay.html)
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